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Apresentação

Um Barracão que guarda histórias do teatro brasileiro

Uma história improvisada... por neyde veneziano

Aquele Barracão, simplesmente, brilhava. Mas não ficava no alto de uma colina. Nem era lar de deuses e deusas. Também não tinha sólidas colunas gregas. Era muito simples. Quase precário. Minúsculo para a grande tarefa a que estava destinado. Carinhosamente, era conhecido como O Pequeno Olimpo.

Minha primeira visita ao Barracão, acompanhada do professor Adilson Barros, provocou a maior sensação de deslumbramento que uma professora-artista poderia ter. Eu vinha da Universidade Católica de Santos, muito organizada, muito dentro das regras, com muitas proibições, muitos deveres e, também, com muitos alunos que lotavam as salas de aula. Ao mesmo tempo, eu fazia doutorado na USP, onde se liam e discutiam, sobretudo, os mestres europeus, sem que ninguém ousasse experimentar o pensamento na cena ou o corpo em ação.

O teatro de verdade acontecia em outro lugar. Minha tão sonhada vida de atriz e diretora se movia devagar e com dificuldades. Eu morava, praticamente, na estrada. Dividida entre São Paulo e Santos. Entre pesquisa e família. Entre teoria e prática.

De repente, eu me encontrava no Barracão das Artes Cênicas da Unicamp, onde tudo acontecia ali, no mesmo local: as discussões, o teatro, as cenas, os ensaios, as leituras e, principalmente, a liberdade poética. Seria possível tanta felicidade? Trabalhar em um único lugar onde se faz e se pensa teatro ao mesmo tempo? Sem uma sala especial, sem conforto, com muito calor e imprevistos, na modesta construção que era habitada invisivelmente pelos gênios do teatro brasileiro? E todos com o mesmo ideal? Pois essa era a beleza. Esse era o prazer.

 

 

Durante o primeiro difícil ano de pandemia, ex-alunos do Departamento de Artes Cênicas juntaram-se virtualmente em um grupo no WhatsApp: os “UNICAMPenses Felizes”. Lembranças em forma de fotos, vídeos, relatos ressurgiram aos montes, enquanto aliviavam a solidão pandêmica. Coletaram material entre as turmas de 1986 a 2000. Trabalho árduo, intenso, criativo e merecedor de tantos aplausos.

Foi então que uma ideia me passou pela cabeça: a de sugerir que organizassem essas lembranças. Um pequeno grupo de cinco (5) ex-alunos unicampenses assumiu o difícil trabalho de coletar e mapear as memórias afetivas e os aprendizados, como matéria prima do futuro AlmanAC. Sugeriram que fosse eu a coordenadora, o que considerei uma honra e uma alegria.
O material coletado revelou a preciosidade do trabalho artístico realizado ali, no Barracão, no período entre 1986 e 2000. Fotos de montagens e de trabalhos comprovaram a vocação unicampense focada na pesquisa das artes brasileiras. Diferente de outros cursos universitários de teatro que olhavam para a Europa e discutiam formas texto-centradas, na UNICAMP o objeto era a arte do Brasil, com suas músicas, suas danças, com suas diversidades culturais, seus corpos coloridos, seus sincretismos religiosos, suas dramaturgias e seu povo.

Para a grande mãe Unicamp o foco é, eternamente, a pesquisa. Junta-se a este ideal nosso AlmacAC, também resultado do trabalho investigativo sobre um passado recente de estudos, emoções e muitos experimentos artísticos. É, ainda, uma bela reflexão sobre o Teatro no Brasil. Cinco artistas, ex-alunos do DAC, extremamente comprometidos com o restauro dos pilares artísticos desse curso, entregaram-se a uma indagação única e minuciosa. Aplicaram-se na coleta de materiais iconográficos e também nas narrativas das lembranças. A memória foi, sem dúvida, a principal ferramenta utilizada pelos cinco desbravadores.

Ana Célia Padovan, Carla Gialucca, Daniele Pimenta, João André Brito Garboggini e Mônica Sucupira formam essa equipe supercompetente e empenhada, a fim de que todos os atores que se formaram ou estudam no DAC da UNICAMP tenham o real entendimento da história desse Barracão, abrigo de grandes artistas, de muitas obras e de sérias reflexões sobre o Teatro no Brasil.

O antigo e modesto Barracão, neste momento, está se modificando fisicamente. A filosofia e os ideais do curso, entretanto, são os mesmos. Em meio aos escombros de hoje, vislumbram-se as reformas que virão com novas configurações, espaços ampliados e visual moderno… ali, seguramente, novas colunas gregas serão erguidas sobre falsos painéis de madeira. A cena resistirá cercada de árvores reais e frondosas mescladas a folhas cenográficas de papel verde, nesse instigante palco unicampense.

Nosso presente é a Arte de Lembrar.

 

 

FICHA TÉCNICA DO SITE

Site dascenicas.com.br • projeto viabilizado por Edital PROAC Nº 38/2021

O Site dascenicas.com.br é fruto do projeto AlmanAC – Memórias do curso de Artes Cênicas da Unicamp – levantamento de iconografia, gravação de relatos de ex-alunos e realização de entrevistas com ex-professores, sobre o processo de criação e os primeiros anos (1985-2000) do Departamento de Artes Cênicas da UNICAMP.

Coordenação: Neyde Veneziano

Produção, levantamento de iconografia e depoimentos, criação de roteiros, narrações, realização de entrevistas, transcrições: Ana Célia Padovan, Carla Hossri, Daniele Pimenta, João André Garboggini e Mônica Sucupira

Logotipo do AlmanAC: Flávia Fábio 

Edição de vídeos das entrevistas, sonorização e montagem dos podcasts: Augusto Spoto / Molécula Mídia

Edição, sonorização e montagem dos minidocumentários: João Barim e Mariana Sucupira

Projeto gráfico: João Barim / Parênteses

Webdesign: Leandro Pereira / Parênteses

Hospedagem do Podcast: Débora Lima / AMANA Marketing Estratégico 

Assessoria de Comunicação: Carol Silveira 

Gestão de Projeto: Via Arte 

 

Agradecimentos

Aos professores Celso Nunes, Helô Cardoso, Marcília Rosário, Marcio Aurelio, Marcio Tadeu, Neyde Veneziano, Paulo Betti, Paulo Vieira, Regina Braga, Reinaldo Santiago, Rogério Cerqueira Leite, Sara Lopes, Wanderley Martins. Representantes das turmas: Alessandra San Martin, Alexandre Gigante, Alice Possani, Bea Curado, Cacá Toledo, Cassia Magaly, Eva Sielawa (in memórian), Gisa Gasparotto, Gustavo Xella, João Maria, Juliana Monteiro, Katia Daher, Luiz Alex, Mariana Corale, Mariana Moura, Rennata Airold, Tania Alonso e Wagner Gori. Mais colaboradores: Cacá Machado, Cia da Hebe, Dirceu Alves Jr, Eliane Giardini, Guilherme Cardoso Villaboim de Carvalho, Gustavo Trestini, Jayme Paez, Luah Guimarães, Marcelo Cardoso Sales Martins, Mario Fernando Bolognesi, Newton Moreno, Raquel Gatica Salinas, Rodrigo Spina, Rodrigo Veneziano, Sidnei Martins, Tika Tiritili, Verônica Fabrini e Zezé Tonezzi.

 

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