O curso da UNICAMP ofertou-se como uma cornucópia, um ‘maná’, um rio de vários afluentes. A princípio, o que parecia confuso, com tantas trilhas, mostrou-se generoso e inspirador. O rigor das técnicas de mímica de Luiz Otávio Burnier, o mergulho na cena brasileira com Neyde Veneziano, os estudos dialéticos com a orientação de Marcio Aurelio, as adaptações contemporâneas de clássicos com Verônica Fabrini, a bufonaria com Beth Azevedo, as artes do circo com Monteiro, os treinamentos corporais de Maria Thais e seus estudos de Meyerhold, dentre tantos. O curso nos deu escolhas e tempo para que cada um encontrasse sua estrada, seu percurso como artista. Não deveria ser essa a função de uma graduação? Abrir espaço para que o aprendiz localize uma ‘estética-ética’ e depois as aprofunde em especializações e nas práticas? Para culminar, o nosso processo de formatura, a adaptação teatral de PRIMEIRAS ESTÓRIAS de João Guimarães Rosa, feita pelo João das Neves, trouxe novas possibilidades, enriquecendo nosso cardápio teatral. Tivemos que trabalhar a adaptação de um material que não nasceu teatro, mas foi conduzido ao teatro por João das Neves. E só aí havia uma grande provocação, extrair a essência do jogo teatral da obra literária. E um espetáculo que se ofertava para fora do palco convencional, da caixa italiana, um ‘site-specific’ ecológico: estávamos num parque, em múltiplos espaços e em relações diferenciadas com a plateia. E o sutil exercício de usar toda a técnica, treinamento, métodos, para compor uma ‘persona’ que conversasse com uma brasilidade rica – nossa memória de ‘brasil’. Eram personagens com a erudição popular de Guimarães, a elegância popular de Neves.  Isso tudo num espetáculo multifocal, sem protagonismos, e com a urgência de fazer com que seus intérpretes pensassem o ‘brasil’ e seus desequilíbrios e sabedorias através de dois gênios, João Guimarães Rosa e João das Neves.